quarta-feira, 5 de julho de 2017

CANDOMBLÉ: Ode à Senescência em tempos de Asilo!




"A cultura é o melhor conforto para a velhice"
Aristóteles




Luz Negra - Rogério Braga


Vivemos em tempos em que, a cada hora, o número de idosos cresce em asilos, como se a família não tivesse tempo para cuidar dos seus. Assim, junto a velhice vem a solidão, o abandono, a tristeza... que acometem a saúde não só mental do idoso.
Nesse instante em que o jovem se dissocia cada vez mais da família, das tradições, dos propósitos espirituais (não faço apologias religiosas nessa expressão), filosóficos e, muitas vezes, sociais, o candomblé vem à tona com sua supervalorização dos idosos. Uma valorização que emprega uma carga moral à religião, que só sobrevive pelas questões orais, preservadas e professoradas pelos mais antigos. Assim, teoricamente, quanto mais antigo mais sábio, uma enciclopédia viva de todo teor teológico e teosófico de nossas tradições.
As profundas transformações sociais em que vivemos tem balançado nossos conceitos de família e mesmo, de responsabilidade. Zygmunt Bauman, um pensador, sociólogo da contemporaneidade, desenvolveu um conceito que é muito bem aplicado para este momento: Modernidade Líquida. Que se refere às constantes necessidades de transformações para adaptação ao meio. Uma teoria muito interessante que define a atualidade.
Os conceitos morais/éticos parecem estar cada vez mais abalados, ou mesmo relegados ao segundo plano, perdendo para o bel prazer, satisfação momentânea ou para o mercado. A família hoje, tem se colocado muito mais para o trabalho que para a própria valorização da vida, da felicidade ou mesmo do cuidado e manutenção dos laços. Os pais contratam profissionais para a educação dos filhos, dão às escolas a responsabilidade sobre a formação moral, ética, profissional, porque educar dá trabalho e exige tempo. Justamente nesse instante, o afeto é rompido. Lacan, um grande psicanalista francês, emprega em suas obras que o papel dos pais está também em castrar o excesso de liberdade, valorizando a união, o respeito, a ordem que começam dentro de casa. Não há rédeas que segurem um adolescente sem limites ou noção de respeito. Tudo começa pela boa educação e respeito professorados pelos responsáveis.
E nesse orbe de pensamento compreendemos que o papel dos pais está por sobre além de bancar uma educação, saúde, segurança de qualidade fora de casa. Eles devem, dentro de seus lares, ensinar o respeito e a valorização dos laços, dos avós, tios, primos, etc. Quando as noções do amor, respeito e valorização não estão bem empregadas esses mesmos pais colherão a amargura de uma velhice na solidão. Ou ainda, o afastamento afetivo antes dessa idade.
O candomblé, em contrapartida a tudo isso, é uma religião e cultura tradicional, onde a valorização do ancião (velho, idoso, antigo, agbá) se dá a todo instante. Porque onde a cultura é oral há a necessidade do culto e reverência às Bíblias Vivas.
Não comer antes do mais velho. Não se sentar na mesma altura que o mais velho. Não falar mais alto que o mais velho. Não se postar acima da cabeça do mais velho. Pedir licença ao passar pelo mais velho. Não se estabelecer numa conversa entre os mais velhos. Essas são todas lições que nos trouxeram até aqui, com a valorização da senescência associada com amor e respeito. Caso essa modernidade adentre em nossas tradições, ela pode nos afetar negativamente, fazendo-nos acreditar nos fundamentos teológicos de livros, ao invés de pessoas que se prostraram e viveram a religião durante as décadas da caminhada.

TATTO BARROS

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