Para, antes de tudo, entendermos o desenvolvimento das tradições africanas no Brasil, devemos lançar olhares sobre a vivência dos povos que foram trazidos para este país, na condição da escravidão. Para tanto, há a necessidade de entender, antropologicamente, historicamente e culturalmente os costumes (tradições) ali desenvolvidas há milênios.
Para entender qualquer tradição "nova", aos nossos olhos, devemos, sobretudo, nos purificar das concepções pre-estabelecidas, pois, o sistema em que vivemos nunca foi e nunca será padrão de nada. A arrogância do ser humano formou as brutalidades com relação às supremacias de crenças e tradições, assim como castigou povos e dizimou populações. Isso tudo para defender seus princípios (ou psedo-principios), nem que fosse as custas de vidas e sangue!
A RELIGIÃO FAMILIAR
Entendendo religião como um conjunto de crenças que, numa determinada estrutura, reconecta o ser humano ao Sagrado, uma origem espiritual, podemos considerar que esta se dava de maneira familiar (antes de 1500 DC), ou ainda de maneira coletiva em povoados e municípios. Assim, essas pessoas louvavam o Sagrado de maneira muito particular.
A religião iorubá, exemplo, louvava em suas terras os Ancestrais Divinizados, pessoas que se tornaram deuses, aos quais rendiam homenagens e mesmo satisfações! Em termos gerais, chamaremos esses seres louvados de Orixás, mas essa definição é academicamente restrita.
A cidade de Oshogbo é, exemplificando, uma cidade onde o Orixá Oxum é louvado anualmente em festivais que existem até os dias de hoje.
A cidade Ondo, é o local onde Ogun é venerado e louvado pelos habitantes, ja a cidade de Oyó, Xangô é o centro de todas as atenções. Esses são orixas, mundialmente conhecidos, aqui no Brasil todas pessoas já ouviram um destes nomes pelo menos uma vez na vida. Isso quer dizer que, todas as pessoas que nascem nesses povoados aprendem sobre os Ancestrais que lhes pertencem, são a eles consagrados e pertencem a essa cadeia de união, que gera laço e troca de forças espirituais (Axé) que alimenta a saúde, longevidade, felicidade e prosperidade de cada um. A lingua, dialeto, é outro fator que diferencia esses povos, cada um tem costumes diferenciados, apesar de haver algumas unidades em seus mais básicos conceitos.
ENTENDENDO DEUS-PAI-CRIADOR
As religiões africanas (iorubanas, fon, bantu) não são politeístas, apesar de muito isso demonstrar. Todos os adeptos, sempre foram monoteístas, pois o criador de toda a essência, a força motriz de tudo é chamada de ELEDUMARE (O Senhor dos Destinos) ou OLORUN (O Senhor dos Céus*). Sendo assim, encontra em si características similares com a visão dos cristãos, onde há um Principio Criador, que a tudo dá Ânimo e, também há os seus intercessores.
A função dos Intercessores, seres abaixo do Criador, que dEle dependem, por suas determinações e Destinos, é estabelecer em nós a vontade, a vida e a fé.
Assim, cada elemento e situação que o Criador faz acontecer, emprega um de seus filhos (criações primeiras, originais) no domínio. À Ogun, coube o domínio sobre as conquistas, também sobre o ferro, lutas, batalhas, guerras, agricultura**; à Oxalá a criação do homem, o ar, a respiração, o sopro de vida, a pureza; Iemanjá o domínio das águas, senhora das cabeças e mãe da humanidade. Aqui estou sendo muito superficial, obviamente a complexidade é muito maior que qualquer dessas especificações.
Em termos gerais, podemos dizer que, quando trazidos ao Brasil, as pessoas desses povoados se misturam e faz com que aconteça aqui um ecumenismo que não ocorria na África. As pessoas de diferentes povoados e diferentes Ancestrais passam a louvar o conjunto espiritual que unifica a todos. O Ancestral Divino de cada um será aqui, louvado por todos, por toda a comunidade, passando a ser Ancestral de todos os membros dessa sociedade. Criando assim, laços familiares (vínculos espirituais)
* OLORUN - Senhor do Orun. Orun, aqui traduzido como Céus, na verdade se trata de um Mundo Espiritual, paralelo ao nosso. Que corresponde ao nosso e, de certa forma, similar.
** AGRICULTURA, na verdade pertence a Okô mas, seu culto no Brasil é menos conhecido, o que vez com que Ogun se tornasse o senhor da Agricultura devido suas Passagens Mitológicas (Itans) com Okô.
OBS: Em breve, traçaremos reflexões bem mais profundas, navegaremos para além da superficialidade.
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